“Imediatamente me dei conta de que enquanto assim queria pensar que tudo era falso, era absolutamente necessário que eu, que o pensava, fosse alguma coisa. E observando que esta verdade: Penso, logo existo, era tão firme e segura que as mais extravagantes suposições dos cépticos não eram capazes de a abalar, considerei poder recebê-la sem escrúpulo para o primeiro princípio da filosofia que buscava. (…) Exactamente porque pensava em duvidar da verdade das outras coisas, resultava muito seguramente que eu existia; ao passo que, bastava eu deixar de pensar, ainda que todo o resto que havia imaginado fosse verdade, não tinha qualquer razão para crer que existia (…)”.
DESCARTES, Discurso do Método, 4ª Parte.
Questão 1 – Explique o argumento mediante o qual Descartes passa da consciência de que é um ser que duvida até à crença no cogito.
“Em seguida, reflectindo sobre o facto de duvidar, constatei, por conseguinte, que o meu ser não era completamente perfeito, pois via claramente que saber era uma perfeição maior do que duvidar. Lembrei-me de procurar onde aprendera a pensar em algo mais perfeito do que eu era e, soube evidentemente que devia ser de uma qualquer natureza que fosse mais perfeita. (…) Porque nada há de mais contrário que o mais perfeito ser um resultado e uma dependência do menos perfeito (…) também não podia tê-la recebido de mim mesmo. De forma que estava a ela ter sido introduzida em mim por uma natureza que seria verdadeiramente mais perfeita do que eu era, e que tivesse até dentro de si todas as perfeições de que eu podia ter uma ideia, isto é, para me explicar numa palavra, que fosse Deus.”
DESCARTES, Discurso do Método, 4ª Parte.
Questão 2 – Explique como chega Descartes à descoberta da ideia de Deus a partir da crença no cogito.
“Em que sentido se pode dizer que, se ignoramos Deus, não podemos ter conhecimento certo de nenhuma outra coisa.
Mas, quando o pensamento que desta maneira se conhece a si mesmo (…) por exemplo, tem em si as ideias dos números e das figuras, e conta também entre as suas noções comuns esta: «se somarmos quantidades iguais a outras quantidades iguais, os totais serão iguais» e muitas outras tão evidentes como esta, por meio das quais é fácil demonstrar que os três ângulos de um triângulo são iguais a dois rectos, etc. Enquanto percebe estas noções e a ordem pela qual deduziu esta conclusão ou outras semelhantes, o pensamento está muito seguro da sua verdade. (…) Em tudo o que lhe parecer muito evidente, vê bem que tem razão para desconfiar da verdade de tudo aquilo de que não se apercebe distintamente e que não poderá ter nenhuma ciência certa até conhecer aquele que o criou.”
DESCARTES, Princípios da Filosofia, artigo 13º.
Questão 3 – Explicite a importância da existência de Deus na teoria cartesiana do conhecimento.
Exercício
Das questões que se seguem escolha a alínea que melhor responde ao problema:
1. Descartes é um filósofo céptico. Esta afirmação é:
a) falsa, porque duvidar não é para ele uma forma de descobrir a verdade;
b) verdadeira, porque o seu método não lhe permite atingir um conhecimento absolutamente verdadeiro;
c) falsa, porque, mais do que descrença na verdade, há suspensão temporária da crença nas verdades estabelecidas.
2. A dúvida é hiperbólica porque:
a) encontrar uma verdade absolutamente indubitável exige um exame severo e impiedoso das nossas crenças.
b) Descartes exagera;
c) põe em causa verdades evidentes;
3. Descartes é um filósofo racionalista porque:
a) acredita que a razão pode, baseada na experiência, construir conhecimentos certos;
b) acredita que a razão, independentemente do apoio dos sentidos, pode descobrir verdades evidentes e fundamentais;
c) acredita que a certeza se baseia na dúvida.
4. Deus é, no sistema cartesiano:
a) uma entidade sem qualquer função gnoseológica;
b) a razão para duvidarmos de todos os nossos conhecimentos;
c) a garantia da objectividade dos nossos conhecimentos.